Uma investigação da Polícia Civil de Mato Grosso apontou indícios de um suposto esquema envolvendo emendas parlamentares durante o período eleitoral de 2024, informa reportagem do portal UOL. Ao menos 14 deputados estaduais, além de um prefeito e um secretário de Estado, são citados como possíveis beneficiários ou participantes de uma rede de favorecimentos na destinação de recursos públicos para a compra de kits agrícolas com indícios de sobrepreço. Todos os envolvidos negam qualquer irregularidade.
A apuração resultou na Operação Suserano, deflagrada em 24 de setembro de 2024 pela Delegacia Especializada de Combate à Corrupção (Deccor), que identificou um prejuízo estimado em R$ 28 milhões aos cofres públicos. Os kits agrícolas, adquiridos por meio de termos de fomento firmados entre a Secretaria de Agricultura Familiar (Seaf) e o Instituto Pronatur, incluíam equipamentos como roçadeiras, motocultivadores, adubadeiras costais e perfuradores de solo. Parte dos kits teria sido adquirida com sobrepreço de R$ 10,2 milhões, segundo os investigadores.
Um documento obtido pelo UOL revela que 13 deputados estaduais foram os autores das emendas parlamentares utilizadas para aquisição dos kits. Estão entre os citados: José Eduardo Botelho (União), Juca do Guaraná (MDB), Cláudio Ferreira (PL, atual prefeito de Rondonópolis), Doutor João José (MDB), Alan Kardec (PSB, atual secretário de Ciência e Tecnologia), Gilberto Cattani (PL), Fabio Tardin (PSB), Julio Campos (União), Faissal Calil (PL), Ondanir Bortolini, o Nininho (PSD), Dr. Eugênio (PSB), Wilson Santos (PSD), Thiago Silva (MDB), Dilmar Dal Bosco (União) e Carlos Avalone (PSDB).
Guimarães não destinou recurso, só recebeu ofício, não foi respondido
Um outro deputado citado, Diego Guimarães enviou nota dizendo que “não indicou entregas nem participou de qualquer entrega dos kits agrícolas”. “Como o deputado não destinou emendas, indicou beneficiários ou participou de entregas dos kits agrícolas, fica evidente seu distanciamento do caso”, afirma a assessoria de Guimarães.
O empresário Alessandro do Nascimento é apontado como o elo entre o poder público e as empresas contratadas. Ele seria sócio oculto de uma rede de companhias utilizadas para receber o dinheiro das emendas. Uma delas, a Tupã Comércio e Representações, está registrada em nome de um suposto laranja, que também atuava como treinador de futebol em associação presidida por Nascimento. A entidade, a Associação Atlética e Cultural Nacional, recebeu mais de R$ 1 milhão em emendas para o projeto social “Craque Cidadão”.
A delegada Juliana Rado, responsável pela investigação, solicitou o encaminhamento do inquérito à Polícia Federal no dia 15 de maio. Segundo ela, há indícios de crime eleitoral e de utilização política da entrega dos kits durante o período de campanha. “Documentos obtidos indicam que houve participação direta dos deputados nos eventos de entrega, utilização política desses eventos em período eleitoral e coleta de informações pessoais dos beneficiários (nome, CPF, telefone e endereço)”, diz um trecho do relatório.
A Polícia também suspeita que Nascimento tenha planejado lavar dinheiro no exterior. De acordo com as investigações, ele teria tentado comprar dois imóveis nos Estados Unidos por R$ 7 milhões com apoio de um contador naquele país. A defesa de Nascimento afirmou que ele “não foi indiciado ou denunciado, sequer foi ouvido pela Polícia Civil” e negou qualquer vínculo contratual com o estado do Mato Grosso.
Em um dos episódios mais reveladores do caso, a polícia recuperou uma caixa com anotações feitas por Nascimento e que teria sido escondida por ele na casa de um casal de amigos, na tentativa de evitar apreensão. O conteúdo incluía os nomes de diversos parlamentares, com valores associados: “500k Nininho”, “1m Botelho” e menções a programas de distribuição de materiais esportivos. A caixa foi entregue dias depois à Polícia Civil.
Outra empresa apontada como ligada ao esquema é a Tubarão Sports, que teria Nascimento como sócio oculto, embora sua defesa negue envolvimento com a operação. Segundo a polícia, a empresa forneceu produtos para emendas pagas por vários dos mesmos deputados.
Além do sobrepreço, a polícia identificou que assessores do deputado Eduardo Botelho assinaram como destinatários dos kits. A suspeita é de que houve entrega de materiais em cidades onde candidatos apoiados pelos deputados concorriam a cargos públicos. Botelho, por exemplo, era candidato a prefeito em Cuiabá, e Thiago Silva, em Rondonópolis — ambas cidades onde os kits foram distribuídos.
Em nota, Eduardo Botelho afirmou: “Nunca participei de nenhuma entrega de obras ou equipamentos durante o período eleitoral”. Cláudio Ferreira, atual prefeito de Rondonópolis, declarou que, enquanto deputado, destinou suas emendas “com vistas a atender os interesses dos cidadãos mato-grossenses, sendo que todas elas foram entregues e cumpridas”.
O deputado Diego Guimarães afirmou que “não indicou entregas nem participou de qualquer entrega dos kits agrícolas”. Já a assessoria do deputado Carlos Avalone disse que “as entregas feitas pelo deputado foram publicizadas nas redes sociais do parlamentar, para total transparência”, e que “não houve entrega de kits em período eleitoral”.
A Polícia Civil destaca ainda que parte das emendas teria sido direcionada a municípios onde os deputados tinham aliados políticos concorrendo em 2024, como Várzea Grande, onde o candidato a prefeito Kalil Baracat (MDB) era apoiado por Julio Campos (União), responsável pela destinação de kits à cidade.
Diante das suspeitas de crime eleitoral, uso indevido de verbas públicas, lavagem de dinheiro e atuação coordenada de agentes públicos e privados, a investigação agora será conduzida pela Polícia Federal. A expectativa é que novos desdobramentos ocorram nos próximos meses.
TODOS DA ALA "deus" PATRIA E FAMILIA.